domingo, 4 de janeiro de 2009

LESÕES DE SOBRECARGA NOS JOVENS ATLETAS


Lesões de sobrecarga mais comuns nos jovens atletas e factores relacionados com o crescimento e maturidade biológica do sistema osteo-articular

Há uma susceptibilidade da cartilagem de crescimento a esforços repetitivos que excedem a sua capacidade de resistência e absorção particularmente no tornozelo, joelho, cotovelo e punho. Em casos extremos mais graves podem surgir lesões da cartilagem articular (osteocondrite dissecante) que podem ter repercussões graves na morfologia anatómica da articulação podendo necessitar de intervenção cirúrgica. Este tipo de lesão nas articulações do membro superior acontecem por exemplo nas ginastas que trabalham desde muito novas com os apoio invertidos, onde essas articulações passam a suportar o peso corporal durante muito tempo e com muitas repetições.
Outro tipo de consequências igualmente graves se não forem despistadas precocemente as lesões na cartilagem de crescimento é a perturbação no processo de crescimento ósseo em si mesmo (paragem parcial ou total desse crescimento).
Também são comuns as fracturas de fadiga nos locais de intensa e repetitiva carga como os ossos metatársicos, a tíbia, o peróneo (nos corredores, p.ex), vértebras lombares - nos istmos articulares que podem levar a situações de instabilidade articular onde o tecido ósseo é substituído por tecido fibroso: espondilólise – (nos tenistas, ginastas e patinadores que realizam movimentos repetitivos e extremos em hiperextensão da coluna lombar associada à rotação - mecanismos desencadeantes desta situação).
Existem também as lesões nos locais de inserção óssea dos músculos mais potentes do membro inferior onde também está a ocorrer o crescimento ósseo (salto pubertário). A inserção do tendão patelar na tíbia (doença de Osgood-Schlatter) ou do tendão de Aquiles na calcâneo (doença de Sever) são os exemplos mais comuns no jovem entre os 10/11 e os 14/16 anos. Pode variar a idade de ocorrência destas lesões em função do sexo e do índice maturacional.
O desfazamento entre o pico de crescimento ósseo e o pico de crescimento músculo-tendinoso, a reduzida flexibilidade desses músculos, a relativa fraqueza destes locais de inserção e o aumento das solicitações mecânicas (forças de tracção) que o jovem atleta é sujeito (p.ex multi-saltos, deslocamentos defensivos, mudanças bruscas de direcção e velocidade) com um esqueleto em crescimento acelerado, explicam o porquê da elevada prevalência destes problemas entre os jovens.
Por último as tendinopatias também são um bom exemplo das lesões de sobrecarga sendo mais comuns no tendão patelar - “jumpers knee”- (basquetebol, voleibol. salto em altura e em comprimento) , no tendão de Aquiles (atletas de fundo e meio fundo), nos tendões da coifa dos rotadores do ombro (natação, ténis, badminton, voleibol, andebol) e nos tendões do punho (ténis, ténis de mesa).


Lesões nos jovens atletas – factores psicossociais

Mas não podemos esquecer que existem outros factores – psicossociais e sócio-desportivos - que em interacção com os descritos atrás, potenciam o risco de lesão e podem comprometer a saúde do atleta. Não sendo o principal tema deste artigo serão apenas descritos de forma muito sucinta alguns dos mais relevantes:
- O desporto de competição e de rendimento nas camadas jovens implica um tempo de exposição ao risco de lesão muito elevado que testa continuamente os seus limites de resistência e de adaptabilidade física, psicológica e mental
- A valorização social no desporto de rendimento cria expectativas, ilusões e desejos de afirmação individual e colectiva que só é atingida por reduzida minoria de atletas. Este factor é potenciado pelo papel que os media têm actualmente na divulgação do fenómeno desportivo.
- A pressão social (família, clube, colegas e pares, treinadores) mesmo que de forma subtil e indirecta centrado nos resultados (vitórias, recordes, medalhas) projecta-se no jovem que se quer afirmar e ter sucesso, o que leva que em algumas situações se corram riscos dos quais nem sempre os atletas conhecem totalmente, ou se os conhecem resolvem desafiá-los. A frase “no pain, no gain” que se ajusta para descrever o espírito de sacrifício, disciplina e capacidade de trabalho que estes jovens devem ter, pode servir para explicar situações em que ou por desconhecimento dos profissionais envolvidos ou por estarem excessivamente focados nos objectivos competitivos se vão ignorando ou desvalorizando sinais de alerta que o corpo do jovem vai dando. Por outro lado também no treino desportivo a quantidade de trabalho (volume e intensidade) nem sempre são sinónimos de qualidade.


Conclusão

Os jovens desportistas não são “adultos em ponto pequeno”. Têm uma dinâmica fisiológica própria, um controle neuro-endócrino e metabólico também específicos e vivem uma realidade psicológica única. Neste contexto todos os profissionais envolvidos de alguma forma no treino de jovens atletas deveriam ter uma formação pedagógico-cientifica sólida e promover a multidisciplinaridade da intervenção.
O conhecimento dos padrões de crescimento e de maturação neurobiológica de cada jovem atleta, a avaliação das suas características físicas e psicossociais, o domínio dos factores de risco de lesão (extrínsecos e intrínsecos) associados à prática da cada modalidade devem constituir os pilares fundamentais da intervenção multidisciplinar para que os jovens atletas possam praticar um melhor desporto num contexto de maior prazer, segurança e afirmação individual e colectiva.

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